sexta-feira, maio 26

Rica em talento pobrezinha em organização

Frustrante é o mínimo que se pode dizer sobre a selecção de Sub-21 que praticamente hipotecou a passagem às meias-finais do Europeu, depois de duas derrotas com a França e com a Sérvia, contabilizando 180 minutos sem marcar nenhum golo, e sofrendo três. Mais do que os resultados o que é confrangedor é a pobreza franciscana das exibições, para um colectivo que entrou de saltos altos convencido que era uma espécie de Brasil dos júniores. Indiscutível a qualidade da matéria-prima, com jogadores que são já mais do que meras esperanças: Quaresma, Moutinho, Nani, Manuel Fernandes e Raúl Meireles, só para nomear aqueles que são titulares indiscutíveis dos seus clubes (os três grandes). A lição a retirar com este amargo sabor da derrota é que uma selecção com aspirações não pode estar exclusivamente dependente do talento e da inspiração dos seus principais jogadores. Todos sabemos que o talento é volúvel e incerto. O que não é incerto, nem volúvel é a organização de jogo, o sentido de colectivo, o espírito de entreajuda, o trabalho. E foi tudo isso que faltou aos "putos" portugueses, uma equipa de talento adormecido e amarrado pelo superior talento e organização da França (uma selecção superior a Portugal em talento e organização) ou pelos sérvios, claramente superiores em organização.
A euforia pré-menstrual em torno da selecção e os episódios que rodearam as convocatórias podem explicar o descalabro, mas o seleccionador Agostinho Oliveira é a face visível da derrota e do desnorte. Não soube construir uma equipa, e após a lição de futebol organizado e maduro que recebemos da França, decidiu dar uma de Scolari e revolucionar o onze no jogo com a Sérvia, remetendo ao banco Moutinho e dando a batuta a Nani, lançando Varela e remetendo Nélson, Rolando e Nuno Morais ao banco - ou seja uma defesa onde só permaneceu um desastrado José Castro. Desastradas opções de um treinador que não percebeu que o modelo de jogo em que nos viciamos e nos deu o apuramento, pura e simplesmente não servia nesta fase final. Ou seja, centros de Quaresma para as entradas a matar de Hugo Almeida. Com Harry Potter blocado e Hugo Almeida sem munições, Portugal secou, e pior do que isso continuo a insistir em despejar bolas para a área contra uma implacável defesa francesa e uma gigantesca defesa sérvia que tem dois centrais que qualquer clube do mundo gostaria de ter. Um treinador de futebol a sério devia saber ler a inoperância deste tipo de jogo e tentar incutir um futebol mais apoiado de passe curto e progressão pela zona central, criando espaços para os remates de meia-distância de Manuel Fernandes e Raul Meireles.
No naufrágio colectivo em que mergulhou a selecção é bom ressalvar dois ou três sobreviventes - Raúl Meireles pela entrega e esclarecimento, Bruno Vale sem culpas e apesar de tudo, Quaresma, batalhador e inconformado, mas sem a chama incendiária que todos lhe reconhecemos. Só um milagre nos dará o apuramento, mas como são novos esperemos que os nossos rapazes reconheçam os erros e façam um bom jogo com a Alemanha. Numa competição de "cantera" destas o mais importante não é o resultado competitivo é sim os ensinamentos a retirar - esperemos que as nossas jovens estrelas que futebol é muito mais que fintas e penteados "fashion", é também humildade e cooperação.
Esperemos também que os nossos "A" tenham visto com atenção os jogos dos putos e que o povão arrefeça um pouco a sua euforia, porque hoje em dia, só o talento não chega para ganhar jogos, é preciso organização e coração.