O triunfo da humildade

Se o Governo mandasse faze um estudo de impacto económico sobre os efeitos do grande derby de sábado nas discussões durante as horas de trabalho, facilmente chegaria à conclusão que o melhor era dar na sexta-feira um feriado só para falar de futebol, desde que durante o resto da semana os trabalhadores se abstivessem de prerorar sobre tão efervescente matéria.

Por isso, eu meto já folga hoje, e falo de derby.

Depois daquele lamentável Penafiel-Benfica, pensei amargurado - esta equipa não merece ser campeã nacional. Mais do que a falta de talento e de fio de jogo - que todos já reconhecíamos neste Benfica - foi a tremenda falta de atitude, de garra e querer que normalmente dá às equipas despovoadas de talento uma força superior à da técnica e da táctica - a da vontade.

Felizmente o estado de euforia depropositada e petulante da pequena nação sportinguista (uma espécie de principado do Lichenstein, quando comparado com a grande nação benfiquista) fez-me voltar à razão.

Teoricamente, acredito que este campeonato devia ser como alguns prémios literários - se o júri entender que nenhum dos candidatos tem talento suficiente para a atribuição do prémio, ele pura e simplesmente não seria atribuído.

Como isso não me parece curial, tenho por mim assente que o justo vencedor desta medíocre edição da Super-Liga é aquele que vencer o jogo de sábado.
O FC Porto, que matematicamente ainda pode chegar ao título não conta, porque este ano foi de renovação, e apesar dos habituais excessos de gestão desportiva, o FCP com o treinador certo, para o ano voltará a recuperar o seu ascendente natural sobre os grandes de Lisboa. O FCP tem o balneário com mais talento por m2 do futebol português, só falta liderança para traduzir o talento em equipa, e a equipa em jogo. Por isso Malvado, este ano espera um bocadinho que não se pode ganhar sempre.

Este elogio público ao FCP não é por acaso.
É só para fazer a devida escala entre o FC Porto dos últimos dois anos e o SCP deste ano. Como disse antes, é o mesmo que comparar cagalhões com serpentinas, e só os fanáticos sportinguistas podem ter o atrevimento espúrio de comparar o Peseiro ao Mourinho.
Essa tese é reveladora de uma de duas naturezas do mal: Ou são fanáticos ayatholas de cachecol verde percebem tanto de futebol como eu de lagares de azeite, ou então são naturalmente estúpidos - tese que merece algum fundamento científico, a julgar pelas declarações habituais do seu presidente - o Dias da Cunha, o dirigente desportivo português que melhor cumpre a job description do "perfeito anormal".


Mas isso não importa para nada. Convém relembrar aos verdetes que a sua "fabulosa máquina de ataque" ao longo de um campeonato mais manhoso que um taxímetro, teve vários momentos dignos de equipa de solteiros e casados - só para recordar a derrota em casa com o Penafiel ou os três secos que levaram nas Antas. Aliás, convém lembrar que nas primeiras cinco jornadas, o Sporteing somou apenas uma vitória - em casa contra o Gil Vicente logo na ronda inaugural, depois foram duas derrotas com o Setúbal e o Marítimo e dois empates tirados a ferros com o Rio Ave e o Leiria.

Pois é, a tal super-equipa que agora falam, era na altura (em Novembro) uma tragédia grega, e muitos que agora empunham o cachecol e tecem hinos ao Peseiro, eram os primeiros a pedir o pescoço troncudo do treinador numa bandeja.
Quem os ouvisse agora, até parece que esse Sporting era de outro campeonato.

A justiça de um campeonato faz-se ao longo de trinta e quatro jornadas, e não daquelas que um adepto mais gosta de se relembrar.

Depois em relação a este Sporting, qualquer pessoa que saiba um pintelhinho de futebol, sabe que apesar do inegável talento, o Sporting só sabe jogar contra equipas "abertas", e dá-se muito mal com "enlatados".
O Sporting só está na final da UEFA porque não apanhou pela frente nenhuma equipa de dimensão verdadeiramente internacional. Passo a citar a lista de ferozes e empolgantes adversários da temível armada leonina:

Rapid Viena
Panionios
D. Tiblisi
Sochaux
Newcastle
Feynoord
Middlesbrough
AZ Alkmar

O Xano atestará que nem o Midellesbrough, nem o Newcastle são propriamente do nível de um - Arsenal, Manchester U, Chelsea e Liverpool - e quanto aos outros, apenas o Feynoord pode almejar a estar assim timidamente numa primeira linha de grandes europeus.
Tivesse saído uma equipa de cinismo italiano, uma "forza" espanhola, ou um grande inglês e dificilmente o Sporting chegaria onde está. Ainda assim com todo o mérito, isto não é para desvalorizar, é só para relativizar a euforia.

Basta comparar o percurso europeu do Sporting, com o do FC Porto da era Mourinho para perceber a diferença de calibre dos adversários.
Por mais meritória e louvável que seja a presença na final da Taça UEFA, compará-la com a do Porto só mesmo para palhaços de circo.

Finalmente, e ainda sobre este Sporting, convém dizer que o "Liedson" resolve, e resolveu mesmo, tal como o Jardel o fez da última vez que foram campeões.
Podem até ganhar jogos sem ele (e sem o Rochemback), mas não deixam de ser uma equipa vulgaríssima sem ele (Newcastle foi a excepção a confirmar a regra).
Ele é de facto o melhor jogador do campeonato e como adepto de futebol, antes de benfiquista, tenho pena dele não estar em campo no sábado, nem que seja para levar porrada do Petit.
Mas, se não está no sábado na Luz, a culpa é só dele e de mais ninguém.

Isso leva-me directamente ao outro assunto, o das arbitragens, que a manada sportinguista agitou como se fosse uma conspiração para levar o Benfica ao colo.
Uma tremenda maquinação ao serviço da pressão que o Sporting (e já agora todas as outras equipas) gostam de fazer para lançar um véu de suspeição sobre as arbitragens.

Na minha opinião, a maioria dos árbitros portugueses são simplesmente maus, e depois há uns quantos que são corruptos. Felizmente os maus não fazem discriminação positiva da sua mediocridade, os corruptos sim.
Pega mal, à sportingalhada e aos morcões do Porto e do Boavista falarem de claros benefícios da arbitragem, quando todos beneficiamos nos últimos anos, aqui e ali. Se há alguém que se pode queixar das arbitragens não é certamente nenhum dos grandes.

Posto isto e só para desmistificar, devo reconhecer que houve um único jogo em que o Benfica foi claramente beneficiado - com o Belenenses - e só houve aquela celeuma toda porque iamos à frente do campeonato, quando nos últimos anos estavam acostumados a que andássemos a lutar pela Europa.

Aliás, há um jornal, que os meus amigos lagartos reputam de credível porque não é o orgão oficial do Benfica, que tem uma coluna chamada campeonato da verdade, que dá pontos sem os erros de arbitragem - e adivinhem lá quem vai à frente desse campeonato da verdade???
Pois é ... Agora expliquem lá isso ao abrigo das vossas teorias patéticas da conspiração.

A mim nunca me ouvirão um queixume acerca de um resultado por causa de uma arbitragem, porque acho que as equipas a sério ganham jogos "apesar" dos erros de arbitragem. Ora, quando o Liedson pontapeou a bola para a bancada, a populaça sportinguista (afinal também têm sócios na Baixa da Banheira e no Laranjeiro) destaou logo a gritar histericamente que já estavam a ser roubados.

Por amor de Deus, queria ver se o Simão tivesse feito a mesma coisa com o Penafiel e não visse um amarelo, o que é que os meus amigos não iriam dizer.
Os sportinguistas têm uma noção muito própria da justiça - a berraria do ó da Guarda quando lhes toca a eles, e a mão no bolso a assobiar para o ar quando é com os outros - o FC Porto este campeonato tem bem mais razões de queixa que o Sporting.
Por isso, a desculpa das arbitragens e do sistema é conversa para camelos, e só os camelos é que embarcam nelas.

Se eu fosse um lagarto adepto dos linchamentos populares já teria invocado aquele golo do Petit contra o Porto que só o árbitro não viu, e o penalti sobre o Geovanni contra o Penafiel, quando o jogo ainda estava zerado. Como não sou de lamechices, passo então a explicar em breve súmula porque é que o Benfica merece ser campeão nacional este ano.

Explica-se tudo numa palavra desconhecida da massa associativa, jogadores e dirigentes do Sporting.

Essa palavra é HUMILDADE.

É por isso que o Sporting nunca há-de ter a dimensão do FC Porto de Mourinho. O Sporting tem talento (mais que o Benfica), arrogância (não tanta como o Porto de Mourinho), mas não tem humildade (como tinha o Porto de Mourinho e o Benfica de Trapattoni).

O Benfica é uma equipa que tem lutado e dado o litro em quase todos os jogos (excepção feita com o Penafiel) e que suprime a sua falta de fio de jogo e de futebol bonito e bem desenhado, com aquela arte de fazer das fraquezas forças.
É feio, é defensivo, é maçador, pos é - eu sou o primeiro crítico das manhas do Trapattoni - mas é abnegado e esforçado. Cada jogo é um "ai jesus" para o Benfica, que entra sempre com o coração na boca, porque não sabe mais, e quem mais não sabe a mais não é obrigado.
Uma equipa que tem alguns bons jogadores, mas que em caso de lesões e castigos é obrigada a ter a titular um jogador tão medíocre como o Bruno Aguiar, ou o Carlitos (acho que nem na II liga tinham lugar) é uma equipa que merece a minha consideração e se quiserem...pena.
É essa equipa que vai defrontar no sábado, os "galácticos" à portuguesa, uma equipa vaidosa e vistosa, que se dá mal com a falta de espaço e que se desorienta quando as coisas não correm de feição.
É um Sporting favorito e de saltos altos que vai no sábado partir para um jogo numa condição sobranceira e de vitória quase antecipada.
O Benfica, vai ser uma equipa nervosa e amedrontada, mas toda a gente sabe que uma equipa nervosa pode ganhar rapidamente nervo, e estaleca. Sábado, os lagartos podem ficar a saber que David contra Golias não é meramente uma história bíblica.
Aliás, sportinguistas do mundo, que estão convencidos que nos vão dar uma coça, andem vão, andem vão para lá de caganças - PODE SER QUE SE FODAM!
Mesmo se perderem, não desanimem , têm sempre a desculpa das arbitragens e do sistema. Mesmo se não fosse do Benfica, num jogo entre a HUMILDADE e a VAIDADE, torceria sempre pela HUMILDADE. É só essa a justiça que peço no sábado.

Até lá, vejam lá se tiram o musgo dos olhos

Um abraço

Rui Pelejão